Manaus (AM) – O acordo entre o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e o Ministério dos Transportes representa um divisor de águas na história da BR-319 e da própria governança ambiental na Amazônia. Pela primeira vez, o Brasil estabelece um pacto institucional com a devida amplitude, que reconhece que não há desenvolvimento legítimo sem respeito aos limites socioambientais da região.

Trata-se de um diálogo aberto e moderado entre as forças interessadas, que, com respeito e moralidade, avançam numa proposta concreta para solucionar esse embaraço que preocupa a todos no Amazonas e àqueles que se preocupam com o futuro da floresta e de seus povos.

A criação do Plano BR-319 Sustentável, sob coordenação do MMA e com a participação dos órgãos ambientais, comunidades locais, pesquisadores, gestores estaduais e outras instituições, marca o início de uma nova abordagem: planejada, pactuada, baseada em ciência e legalidade, com controle ambiental real, participação das populações locais e transparência. Para isso, será criada uma comissão interministerial e um comitê executivo com representantes técnicos.

A ideia é ampliar a governança ambiental na região do entorno da rodovia, com a destinação de terras públicas para a criação de parques nacionais, reservas extrativistas, florestas nacionais, terras indígenas e outras modalidades de gestão territorial. Será indispensável ainda a instalação de órgãos relacionados à gestão ambiental, como o IBAMA, ICMBio, PRF, Polícia Federal e FUNAI.

O grupo também contratará uma Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) para entender os impactos de longo prazo e todas as áreas que serão afetadas pela pavimentação da BR-319 — inclusive os danos sobre a cidade de Manaus e outras próximas como Careiro Castanho, Careiro da Várzea, Manaquiri, Autazes, Lábrea Tapauá e Humaitá.

Haverá também investimentos em atividades sustentáveis, como sistemas agroflorestais e o manejo florestal; e de recursos pesqueiros — como o manejo do pirarucu, que já ocorre na região, monitorado, incentivado e autorizado pelo IBAMA. Não podemos esquecer dos projetos de manejo de quelônios, já históricos em comunidades como Pacatuba, Santo Antônio do Mamori, Igapó-Açu e Tupana, entre outras, bem como dos projetos realizados nas margens do Rio Purus e de outros rios da região onde destaco o papel preponderante do turismo de natureza com a pesca esportiva e os hotéis de selva.

A restauração florestal de áreas degradadas também está no radar do Plano BR-319. Trata-se de uma medida fundamental para a redução da emissão de gases de efeito estufa no entorno da rodovia, com geração de renda para os moradores locais por meio da produção de mudas, do plantio e dos cuidados necessários à revitalização da floresta.

No Amazonas, o IBAMA tem papel decisivo nesse processo. A Superintendência Estadual tem atuado em duas frentes complementares: a fiscalização ambiental efetiva, para conter ramais ilegais, ocupações desordenadas e desmatamento especulativo; e o diálogo técnico e territorial com atores locais, fortalecendo a escuta, o planejamento em bases sustentáveis e as atividades que já ocorrem no entorno da rodovia.

Como Superintendente do IBAMA-AM, tenho certeza de que é possível, sim, reconstruir a BR-319, mas que isso só será viável com controle rigoroso, respeito às leis ambientais e compromisso com as futuras gerações. Não se trata de bloquear o progresso, mas de impedir que ele destrua o que não pode ser substituído: a floresta, os povos, a biodiversidade.

O futuro da Amazônia exige inteligência institucional, responsabilidade pública e coragem política. É isso que o Brasil começa a construir agora — e que nós, no Amazonas, já estamos praticando. Estamos à disposição dos nossos gestores e do povo do Amazonas para participar ativamente do Plano BR-319.

Joel Bentes Araújo Filho Amazonense, geógrafo, gestor ambiental, analista ambiental e, atualmente, Superintendente do IBAMA no Amazonas.

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