Apesar dos desafios, comunicadoras afirmam que é possível conquistar espaço e usar a comunicação a favor das mulheres negras

Por: Lanna Melero | Edição: Lucas Marlon | Foto: Gabriel Barros e Bárbara Lo Prete

A comunicação é uma poderosa ferramenta para mulheres negras ditarem representações midiáticas e conquistarem liberdade financeira. Devido ao racismo estrutural, mulheres negras possuem menos oportunidades e baixa representatividade profissional. Por isso, debater desigualdades raciais e estratégias são importantes para que mais mulheres negras ocupem suas funções com mais igualdade.

Plateia de “Comunicação como ferramenta de poder para mulheres negras” foto de Gabriel Barros.

Segundo Luciana Novaes, gerente de marca da Fundação Lemann, apenas 17% das mulheres na área de comunicação são negras, 8% estão em cargos de diretoria em agências de comunicação, 3% são CEO e menos de 1% ocupam a comunicação corporativa. Apesar do bom desempenho acadêmico e profissional, mulheres negras não dispõem de igualdade de reconhecimento. Como exemplo, Basilia Rodrigues, apresentadora e analista de política, cita o caso em que a Ministra do TSE, Vera Lúcia Araújo, foi impedida de entrar em um seminário promovido pela Comissão de Ética Pública (CEP).

“O que mais a gente precisa? Eu preciso me tornar uma mulher branca para conseguir um financiamento?”, relatou Eliane Silva, sócia diretora da Alma Preta Jornalismo, ao expor recusas de apoios filantrópicos sob a alegação de “falta de impacto social” por parte do veículo, mesmo que a Alma Preta tenha ganho o “Leão de Prata” no Cannes Lion deste ano. 

Elaine Silva, sócia diretora na Alma Preta Jornalismo, responsável por áreas estratégicas como RH, administrativo e projetos, durante palestra no 20º Congresso da Abraji. Com formação em Administração de Empresas e Gestão Financeira (UNIESP e Anhembi Morumbi), Elaine também atua no planejamento estratégico e na captação de recursos, sendo sócia da Black Adnetwork e do Instituto Fala! Foto: Gabriel Barros.

Apesar das grandes empresas falarem mais sobre representatividade e diversidade, políticas de ações afirmativas ficam de lado e não há um olhar atento para a questão, aponta Basilia. “Sem dó, eu digo: ‘falar sobre diversidade nas grandes empresas ainda é um belo discurso, mas que pouco é colocado em prática”.“É nessa sociedade massacrante que se você não estiver bem calçada, vão pisar na sua cabeça”, acrescentou. 

Muitas mulheres negras enfrentam ambientes hostis à sua raça de forma solitária. Por isso, é importante existir uma rede apoio no ambiente de trabalho para essa população. “É muito importante entrar numa redação e ver pessoas iguais a você. É muito importante você estar no seu ambiente de trabalho e poder soltar o seu cabelo sem que alguém fique tocando”, ressaltou Luciana.  

Basília Rodrigues, apresentadora e analista de política; Elaine Silva, sócia Diretora na Alma Preta; Luciana Novaes, gerente de marca e posicionamento da Fundação Lemann, e Gabriela Bispo, do Youtube Brasil durante a palestra no 20° Congresso da Abraji. Foto: Bárbara Lo Prete

Estratégias para enfrentar desafios diários

De acordo com Luciana, é preciso “atuar sempre com um olhar para a redução de desigualdades e também acesso” durante as atividades profissionais. Com isso, Basilia, uma das diretoras da ABRAJI, desenvolveu um programa de bolsas para mulheres negras participarem do Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo. Mais de 30 mulheres puderam se capacitar através do evento. “Eu tenho 25 anos de carreira e esta é a primeira vez que eu participo de uma mesa majoritariamente formada por mulheres negras”, relatou Eliane.

Estabelecer uma rede de apoio dentro das redações foi o principal ponto levantado pelas três profissionais. Segundo Novaes, estar em um ambiente com pessoas com realidades semelhantes garante a permanência das mulheres no espaço e encoraja outras a tentarem. Uma entende a dor da outra e você não precisa ficar se explicando sempre”, expressou a sócia-diretora da Alma Preta.

Com mais de 12 anos de experiência em comunicação de impacto social, Luciana atua como gerente de marca e posicionamento da Fundação Lemann. Formada em Publicidade e Propaganda pelas Belas Artes, muito dedicada, possui duas pós-graduações, sendo a mais recente na PUC-RS, em Direitos Humanos, Responsabilidade Social e Cidadania Global. Foto de Gabriel Barros.

As comunicadoras relembram que é preciso que empresas de fato invistam em diversidade com iniciativas semelhantes a da ABRAJI. “A gente precisa dar mais chances e condições para que as pessoas se formem e também se desenvolvam”, informou Luciana. Por outro lado, mulheres negras também precisam moldar comportamentos para melhor enfrentarem as dificuldades. Para isso, Basilia recomendou estabelecer mais conexões e Luciana a se impor mais. “Não peça muitas desculpas e licenças. Ocupem o espaço com muita firmeza”, falou.

Já Eliane recomendou uma mudança de paradigma para que veículos alternativos possam se desenvolver. ”Em menos de seis meses eu consegui trazer uma receita de 1 milhão”. O caminho até bons resultados é ser insistente com respostas negativas e desconstruir a ideia de que veículos independentes devem ser reféns da filantropia. “Uma das maiores dificuldades é a aceitação que precisamos de outras pessoas para desenvolver o nosso negócio. Quando a gente quebra esse tabu para dar vazão a criatividade, a gente consegue fazer com que o negócio cresça”.

Gabriela Bispo.

Texto produzido por estudantes, recém-formados e jornalistas integrantes da Redação Laboratorial do Repórter do Futuro, sob coordenação da  OBORÉ e da Abraji.

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