Por: Lara Batista | Edição: Marcelo Soares | Arte: Malu Vieira | Fotos: Gabriel Eid
“Antes de sermos jornalistas, nós somos nossos povos, nós somos nosso corpo, território”, afirma Juliana Lourenço, conselheira da Articulação Brasileira de Indígenas Jornalistas (Abrinjor). O jornalismo indígena tem crescido e se consolidado como uma força fundamental na produção de narrativas plurais, críticas e conectadas às realidades dos povos originários. “O território é uma extensão do nosso corpo físico”, afirma ela.
Na mesa “O que a mídia tradicional pode aprender com o jornalismo indígena?”, Jamille Anahata, Juliana Lourenço e Robson Delgado Baré contam a importância de ocupar espaços na mídia para romper estereótipos e garantir que as histórias sejam contadas por quem as vive.



“Quando a gente fala sobre povos indígenas, é importante tratar de forma mais respeitosa”, evitando estereótipos, aponta Robson. Segundo ele, é preciso levar em consideração a violência que as comunidades originárias já vivenciaram nas mídias tradicionais . “Não falamos apenas por nós, mas também por outras representações, por diversos povos”, afirma.
Para ajudar nesse desafio, o grupo preparou um Manual de Redação do Jornalismo Indígena, que será publicado durante a COP30. O livro propõe um jornalismo mais responsável, com diretrizes e práticas que valorizam o protagonismo indígena e rompem com os vícios da cobertura tradicional.
A mídia tradicional, aponta Juliana, busca sempre um mediador, como antropólogos e indigenistas, para falar sobre os povos indígenas, em vez de ouvir diretamente os jornalistas e comunicadores indígenas. “É preciso parar com essa ideia de ‘dar voz aos povos indígenas’. O indígena já tem voz, ele pode falar por si.” O jornalismo indígena valoriza e destaca esse conhecimento próprio, mostrando os indígenas como agentes ativos na construção de saberes e ciência que dialogam com o presente.
“Estamos trazendo o trabalho das nossas lideranças para o espaço da universidade, para o espaço do jornalismo e da comunicação como um todo”, destaca Anahata.
A comunicação indígena surge da articulação política dos povos originários e se fortalece com o acesso da criação de redes próprias de mídia, aponta Juliana. Mais do que informar, ela mobiliza e protege, conectando diferentes territórios e enfrentando os estereótipos da imprensa tradicional com responsabilidade coletiva e protagonismo.
Esse “fazer jornalismo” nasce da urgência de romper com as narrativas hegemônicas, que historicamente invisibilizam e homogeneizam as múltiplas identidades indígenas no Brasil.
A capacidade de alcançar uma diversidade de povos espalhados pelos biomas do Brasil adaptando-se às especificidades do território e cultura dos povos originários é algo singular da comunicação indígena.

De bioma à bioma: comunicação indígena contra a desinformação
De acordo com Juliana, a comunicação indígena foi muito responsável por, na época da pandemia, enfrentar a desinformação sobre vacinas que entravam nos territórios. O compromisso da comunicação indígena vai além da cobertura jornalística: envolve responsabilidade coletiva e retorno à comunidade.
“As nossas pautas e lutas pelos povos indígenas e pelos nossos territórios não dizem respeito apenas a nós, elas são de todos”, diz Anahata. De acordo com ela, o protagonismo só é possível se houver ouvidos atentos e pessoas dispostas a compreender que essa causa é coletiva. “A vida e a natureza pertencem a todos”, finaliza.
Texto produzido por estudantes, recém-formados e jornalistas integrantes da Redação Laboratorial do Repórter do Futuro, sob coordenação da OBORÉ e da Abraji.